Distúrbios Comportamentais na Infância

Abordagem Neurológica dos Distúrbios Comportamentais na Infância

 

FARIAS, Antônio Carlos De. Abordagem Neurológica dos Distúrbios Comportamentais na Infância. Disponível em: <http://www.neuropediatria.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=106:abordagem-neurologica-dos-disturbios-comportamentais-na-infancia-&catid=62:disturbio-de-comportamento&Itemid=147>. Acesso em: 11 dez. 2012.

 

Introdução

A diferenciação entre um comportamento normal e patológico nem sempre é clara; Não existe um critério uniforme e inequívoco do que seja um comportamento normal. As pessoas são diferentes uma das outras, crescem em ambientes com variadas culturas e crenças, vivenciam as situações da vida com as suas maneiras próprias de ser.

Não se pode julgar as alterações comportamentais de uma criança sem antes entender a sua história de vida, a herança genética e a experiência herdada dos seus pais, o ambiente em que cresceu e a forma como interagiu e interage com ele.

 

A Determinação genética e as influências ambientais

O comportamento humano é o resultado da interação entre a programação genética que controla a formação e organização do sistema nervoso e as circunstâncias ambientais em que o individuo se encontra ao longo do seu processo de evolução.

Os genes contêm as instruções iniciais para a formação do sistema nervoso, incluindo, as estruturas anatômicas e químicas que participarão do processo de modulação comportamental com a finalidade de adaptar o indivíduo ao seu meio ambiente; codificações genéticas inadequadas podem ocasionar cérebros malformados em sua estrutura anatômica ou química gerando distúrbios cognitivos e ou comportamentais.

Muitos aspectos do que somos que antes eram imputadas as influências ambientais são hoje mais corretamente reconhecidos como déficits cerebrais por herança genética. As maiorias dos genes implicados com os distúrbios mentais variam no modo e intensidade como se manifestam nas sucessivas gerações familiares: um pai pode apresentar uma forma leve de distúrbio mental e o seu filho pode apresentar uma forma mais grave.

O ambiente através dos vários estímulos externos determina quais circuitos cerebrais serão mais desenvolvidos com a finalidade de adaptar o indivíduo ao seu meio externo; estes processos ocorrem de forma dinâmica ao longo de toda a vida, em cada novo aprendizado se estabelece um novo circuito de memória. A ação ambiental inadequada pode reforçar circuitos cerebrais de memória para a má conduta; Se uma criança é agredida ela memoriza o ato e aprende agredir; Se uma criança desenvolve-se em um meio de amor e diálogo ela memoriza o ato e aprende a dialogar e amar.

 

Abordagem das alterações agudas do comportamento

Transtornos agudos do comportamento devem ser abordados como um quadro emergencial, uma vez que, várias situações médicas podem causá-los, sendo alguns deles, um risco potencial de morte para o paciente.

Se no passado recente a maioria desses pacientes recebia atendimento em hospitais psiquiátricos, a evolução dos meios diagnósticos e a necessária humanização dos serviços médicos propiciaram atendimentos de melhor qualidade nos hospitais gerais.

Situações causadoras de distúrbios comportamentais como intoxicações, distúrbios metabólicos e hidroeletrolíticos, hematomas intracerebrais, requerem atendimento em locais com estrutura física adequada, equipe especializada, laboratórios e serviços de imagem – 24 horas, porque viabilizam diagnóstico e intervenção precoce.

Passado essa fase de atendimento, é prudente que a hospitalização seja de curta duração, sendo o paciente posteriormente encaminhado para um ambulatório de saúde mental ou para outras especialidades dependendo do seu diagnóstico clínico.

Sintomas mais frequentemente observados em alterações agudas do comportamento:

• Inespecíficos: pânico, euforia, desinibição verbal, agressividade;

• Agitação psicomotora: hiperatividade psíquica e motora sem finalidade aparente;

• Confusão: desorientação

•Delírios: desorientação, despersonalização, alteração da percepção
• Alucinação: visuais e auditivas

As principais causas de alterações agudas do comportamento podem ser classificadas em:

A: Sintomáticas – Relacionadas a enfermidades sistêmicas que possam comprometer secundariamente o sistema nervoso. Geralmente cursam com alteração do nível de consciência.

• Intoxicações

• Drogas

• Infecções do SNC

• Distúrbios hidroeletrolíticos e metabólicos

• TCE

• Estado de mal convulsivo de crises tipo parcial complexa ou ausência

• Doenças crônicas sistêmicas

 

B: Psicóticas – Relacionadas a doenças psiquiátricas. Geralmente preservam o nível de consciência mas desestruturam o pensamento.

• Surto psicótico

• Mania

 

C: Não psicóticas – Relacionadas a doenças psicossomáticas. Não comprometem o nível de consciência e tampouco comprometem a qualidade do pensamento.

Geralmente associa-se a conflitos psíquicos.

• Pânico

• Conversão

• Somatização

Todas estas causas podem ser facilmente diferenciadas através de uma anamnese detalhada. As pautas de atuação da equipe médica devem seguir a seguinte seqüência:

• Observação da conduta para depois definir sobre a necessidade ou não de contenção – química ou física ou ambas.

• Descartar causas sintomáticas

• Diferenciar causas psicóticas de não psicóticas

 

O comprometimento do nível de consciência tende o diagnóstico para uma causa sintomática; a desestruturação do pensamento para uma causa psicótica, lembrando que as esquizofrenias é um distúrbio que se inicia na adolescência ou inicio da vida adulta e tem uma evolução com períodos livres de sintomas. Não se deve suspeitar do quadro quando o primeiro surto ocorre em crianças de baixa idade.

Antes da puberdade geralmente o surto psicótico associa-se a doenças sistêmicas, EX – Lupus eritematoso sistêmico. Os quadros psicossomáticos geralmente associam-se a ganhos secundários e freqüentemente relaciona-se a maus tratos e agressões físicas.

 

Abordagem das alterações crônicas do comportamento

O atendimento a crianças com transtornos crônicos do comportamento geralmente demanda o trabalho de uma equipe multidisciplinar. O comportamento inadequado freqüentemente desestrutura as relações acadêmicas, familiares e sociais da criança.

O auxílio de uma equipe especializada envolvendo médicos, psicólogos, assistentes sociais, propicia uma melhor análise e abordagem, ao considerar todas as variáveis médicas e não médicas que colaboram para o agravamento do quadro.

A Interpretação entre um comportamento difícil, mas normal, e um comportamento patológico nem sempre é clara; muitos problemas, às vezes, erroneamente interpretados como patológicos são típicos e esperados em certos estágios da vida infantil:

• Ansiedade de Separação – 8 a 24 meses – a criança adquire a capacidade de distinguir a mãe de outras pessoas e se assusta quando se aproxima de estranho ou quando a mãe momentaneamente se afasta.

• Comportamento Opositivo (birras) – 24 a 48 meses – tentativa de autonomia da criança.
• Pensamento mágico – 36 a 48 meses – a criança não separa o real do imaginário, nessa fase são comuns o medo, as fobias e as mentiras.

• Fobia escolar – 6 a 7 anos

• Angústia da Puberdade – Adolescência

 

Outros são decorrentes de um padrão de temperamento ou associados a funções biológicas irregulares

• Humor negativo – reações intensas a estímulos banais, inadaptação a situações novas, mal humor

• Distúrbio do ciclo do sono, alimentação e excreção

• Transtorno de ajustamento – reação a um stress agudo claramente identificável

 

Ao abordar o problema é sempre importante analisar:

 

A. As características dos pais:

Perfil comportamental, Temperamento, Expectativas em relação ao filho, Doenças neuropsiquiátricas.

 

B. As características da criança

Fase do desenvolvimento psíquico, Temperamento, Ritmo biológico de sono-vigília, alimentação e excreções, hábitos, saúde pregressa.

 

C. O contexto em que o comportamento considerado patológico ocorre

Ambiente, Dinâmica de funcionamento familiar e escolar.

 

Um comportamento patológico é mais provável quando, possui uma característica crônica, mais de um tipo de problema comportamental envolvido, interferindo com a função cognitiva e social da criança, manifestando-se em todos os ambientes e sendo observado por diferentes pessoas do seu convívio. A prevalência desses comportamentos patológicos na população pediátrica varia de acordo como os problemas são definidos e medidos, os índices oscilam entre 2 e 10%.

 

Os sintomas crônicos geralmente associados a comportamento patológicos são:

• Ansiedade: (hipercinesia, impulsividade, irritabilidade, pânico, obsessão, compulsão)

• Distúrbios do humor: (depressão, isolamento, hipoatividade, insônia, fadiga, cansaço)

• Distúrbios do movimento: (tics)

• Pobre interação social

• Alterações cognitivas: (déficit de atenção, memória, linguagem, etc)

 

Dependendo da patologia esses sintomas podem ou não estar presentes, também podem oscilar em intensidade e gravidade.

As principais causas são doenças neuropsiquiátricas como:

• TDAH

• S. Tourret

• TOC

• Autismo

• Transtornos psiquiátricos

 

Estas doenças têm origem multifatorial (genética, ambiental), são decorrentes de um mau funcionamento de circuitos cerebrais relacionados à regulação do comportamento, ocorre déficit de neurotransmissores como p.ex. Dopamina e serotonina, cursam com alterações afetivas, cognitivas e comportamentais e podem ser comórbidas em um mesmo indivíduo. O diagnóstico diferencial entre elas envolve uma história clínica detalhada com aplicação de questionários específicos (DSM-IV). Os exames complementares são de pouquíssima utilidade para o diagnóstico.

 

Outras patologias cerebrais podem alterar os circuitos cerebrais relacionados com a regulação do comportamento como por exemplo:

• Epilepsias

• Moléstia Reumática – Coréia de Sidehan

• Tumores cerebrais

• Doenças endocrinológicas

 

Nestes casos os métodos complementares como prova de atividade inflamatórias, dosagens sérica de hormônios, eletroencefalograma e exames de neuroimagem são importantes apêndices no diagnóstico e tratamento .

 

Tratamento

Terapia comportamental cognitiva

Terapia baseada em condicionamentos psicológicos que visam o rompimento de padrões patológicos de comportamento.

 

Psicofarmacoterapia

A psicofarmacoterapia vem ocupando um lugar de destaque no tratamento não só de adultos mais também de crianças e adolescentes; Tem por objetivo melhorar as funções cognitivas (atenção, memória, concentração) e afetivas (humor, disposição) que possibilitem uma melhora da integração social da criança. Deve ser um recurso complementar a psicoterapia.

 

Prevenção

A prevenção dos distúrbios comportamentais deve iniciar já no momento em que o casal idealiza ter um filho; futuros pais devem evitar exposição a agentes ambientais que comprovadamente podem causar alterações nas células reprodutivas ou interferir sobre o processo de formação e desenvolvimento cerebral do futuro filho.

O fumo p. ex. contém a nicotina responsável por diminuição da circulação placentária, ocasiona um menor aporte de Oxigênio para o feto o que interfere com a migração natural dos neurônios e formação de novas conexões (sinapses). Mães fumantes têm 50% a mais de riscos que as não fumantes de apresentar filhos com retardo mental e TDAH. Drogas, álcool, desnutrição materna, infecções no período gestacional são outras possíveis causas. O homem também deve ter alguns cuidados, os espermatozoide são vulneráveis a estes agentes ambientais, considerando que eles possuem uma vida útil de 3 meses, este seria um período de segurança para o homem que prospectivamente deseja ter um filho.

 

O aconselhamento genético é importante para casais que apresentam histórico de doenças neuropsiquiátricas ou retardo mental na família. A gestante deve regularmente realizar as consultas de pré-natal e realizar exames complementares para identificação precoce de problemas no feto.

 

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